Em fevereiro fui procurado pela colega jornalista Nina Gazire, repórter da revista dedicada a temas como arte, design, cultura contemporânea e tecnologia seLecT, da Editora Três. O assunto de nossa conversa foi bem instigante: ela procurava fontes para uma matéria sobre o assunto principal da publicação para o bimestre de abril/maio, uma edição com um verdadeiro dossiê sobre a água. Especificamente, Nina estava preparando uma reportagem sobre o ponto de vista da ficção científica, como escritores daquele gênero haviam sido inspirados ao longo dos tempos, desde o pioneirismo de Jules Verne e suas 20 mil léguas submarinas, pelo principal fator ligado à vida em nosso planeta.
A matéria acabou de sair, fazendo parte do material chamado Código Água na capa da revista. A pauta sobre o legado da FC na área ficou particularmente ótima, contando com a contribuição sempre erudita e pop de Fábio Fernandes, que ajudou Nina em um completo levantamento do que de mais importante saiu da cabeça de uma infinidade de escritores com a inspiração aquática. Quero aproveitar a oportunidade para registrar aqui no blog a entrevista completa que dei à seLecT.
É possível dizer que o gênero Steampunk é um gênero embebido de um apelo estético maior do que os outros gêneros de ficção científica? Digo isso, pela especificidade imagética e que ele provoca ou idealiza na suas narrativas ao mesclar estilos históricos visuais com certo anacronismo.
Apesar de haver outros gêneros com forte pendor estético, como o cyberpunk, com suas roupas de couro e óculos espelhados, acredito que, sim, o steampunk é mesmo uma parte da ficção científica em que essa questão aparece com mais força. Tanto que existem muitas pessoas que se definem como sendo steamers (ou steampunkers) mesmo sem conhecer muito da produção literária do gênero, apenas pelo gosto de usar roupas de época reinventadas ou mesmo de customizar objetos, como fazer um computador parecer peça antiga, por exemplo. Existem no mundo e mesmo no Brasil estilistas que cuidam de lançar roupas, como corpetes e capas, indumentárias completas, com uma inspiração neovitoriana. Lili Angélika, estilista residente em São Paulo, é um bom exemplo disso, já tive a oportunidade de conferir dois desfiles promovidos por ela na capital paulista.
Dentro deste gênero, existe algum romance ou produção que envolva questões ligadas à ecologia ou catástrofes ambientais? Penso que por ser um gênero surgido a partir dos anos 1980 ao mesmo tempo que as questões sobre o meio ambiente começam ocupar a agenda política com maior ênfase, talvez algum autor tenha trabalhado isso dentro do gênero. Isso é possível? Se sim, quais autores trabalham essas questões?
Essa preocupação já apareceu logo no primeiro romance do gênero, escrito por Bruce Sterling e William Gibson em 1990 (e que vai ser finalmente publicado no Brasil agora em 2012), A Máquina Diferencial. Naquela obra a dupla de autores especulava o que poderia ter acontecido caso a máquina de cálculos complexos (uma espécie de antepassado do nosso computador) projetado por Charles Babage realmente fosse construído no séc XIX. No livro, vemos entre as consequências disso uma espécie de superpotência britânica e o aumento da poluição representada por uma espécie de fog criado pelo homem, envolvendo a ilha. Outro exemplo, publicado no Brasil, é uma história protagonizada por Sherlock Holmes escrita pelo inglês John Gribbin e publicada por aqui na Isaac Asimov Magazine 18. Em português, o conto levou o nome de "O caso do ácido carbônico", no original "The carbon papers". O famoso detetive investiga um caso que é considerado sigiloso pela sua implicação: ele descobriria evidências de que a Revolução Industrial em vigor em sua época iria acabar provocando desastres ambientais em um futuro não muito distante (ou seja, nosso presente).
Mas devo dizer que existe todo um subgênero influenciado pelo steampunk, mas à parte, em que as questões ambientais são o cerne: o greenpunk. A ideia é levar a sério o bordão punk do "faça você mesmo" e buscar soluções para os problemas ambientais. O Brasil vai ter uma coletânea baseada nessas ideias e ideais a ser publicada este ano pela editora Draco. O nome do livro será Solarpunk e sua organização ficou de responsabilidade do escritor carioca Gerson Lodi-Ribeiro (o mesmo que organizou duas outras coletâneas para a editora, Vaporpunk e Dieselpunk). Enviei um conto para concorrer a uma vaga nesse livro, ambientado na maior estufa do mundo, que trata de questões como manipulação genética para se fabricar armamentos e uso alguma tecnologia baseada em painéis solares.
A água sempre esteve presente na literatura fantástica ou de ficção científica de alguma maneira. Ou como histórias passadas em oceanos, ilhas ou os mares de planetas imaginários. Seja no livro de Jules Verne em Vinte mil léguas submarinas ou nos livros de Frederik Pohl e Jack Williamson, o oceano é algo tão inexplorado e perigoso quanto o espaço sideral. A ideia de navegação é usada para esses dois ambientes, que envolvem um imaginário que já foi metáfora para ideologias colonizadoras e etnocêntricas. É possível pensar em uma oposição entre esses dois “lugares” dentro da ficção científica? Essa questão acima não procede no âmbito do Steampunk ?
No livro Deus Ex Machina - Anjos e demônios na Era do Vapor, lançado pela editora mineira Estronho em 2011, tenho um conto steampunk chamado "A Conquista dos Mares". Eu tento explorar algumas metáforas possíveis para o papel dos oceanos em duas facções em guerra nele. Um outro autor que explorou o tema, remetendo diretamente ao caso do livro de Jules Verne que você citou, é o mineiro Flávio Medeiros Jr. na coletânea Steampunk - Histórias de um passado extraordinário. No conto "Por um fio" ele também enfatiza a importância dos mares, um território em disputa em uma guerra de duas potências imperialistas.
Existe alguma produção dentro do gênero que tenha alguma questão ligada a água ou tenha ambientes aquáticos como cenário? É possível falar de uma produção dentro do gênero ligada a este âmbito?
Fora esses exemplos que dei enquanto respondia as perguntas acima, não me ocorre nada tão específico assim. Talvez o Gerson Lodi-Ribeiro esteja recebendo contos em que a água tenha uma importância tão central assim, já que as questões ambientais são o centro da antologia que ele está organizando.
Um comentário:
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