12.1.10

A extraordinária Liga de Alan Moore

Este 2010 não está sendo o Ano do Vapor só por conta dos lançamentos previstos de livros e de quadrinhos steampunk nacionais. A agenda de obras estrangeiras do gênero que devem ganhar versões em nosso país também  é promissora. Já tivemos, logo nos primeiros dias do ano, o retorno da graphic novel Gotham by Gaslight e o novo filme inspirado em Sherlock Holmes, obras com fartos elementos steamers. Mas o melhor ainda está por vir, como podemos ler no blog Quadriteca de Gabriel Rocha:

O ano começa com uma boa notícia para os fãs de Alan Moore: a editora Devir vai finalmente lançar no Brasil The League of Extraordinary Gentlemen (Vol III): Century, a provável conclusão da saga da Liga Extraordinária. Mais uma vez a HQ vai contar com os desenhos de Kevin O'Neill.

Para quem não sabe, a Liga Extraordinária é uma super-equipe recrutada pelo Império Britânico e formada por personagens da literatura vitoriana. Nos dois primeiros volumes, o grupo era composto por Allan Quatermain (das Minas do Rei Salomão), Wilhelmina Murray (de Drácula), Dr. Jekyll/Mr. Hyde (O Médico e o Monstro) e Capitão Nemo (20.000 Léguas Submarinas).

O terceiro volume se passa no decorrer do século XX e início do século XXI (leia mais aqui). Century está programada para ter três partes. Apenas a primeira delas já foi lançada lá fora. A segunda deve sair em abril/maio deste ano e a última só em 2011.

Quem nunca leu nada do super-grupo não precisa ficar boiando, porque a Panini prometeu republicar o primeiro volume da Liga por aqui. Agora só vai ficar faltando uma edição nacional da graphic novel The Black Dossier, que aborda formações anteriores da Liga, para que todo o material com os personagens tenha sido publicado no Brasil.

Para comemorar essa boa nova, resolvi compilar material que saiu no volume anterior a este que vai ser publicado agora no Brasil. O texto abaixo reune as referências ao Brasil e arredores no Almanaque do Novo Viajante, uma espécie de anexo constande no Volume II da Liga Extraordinária. Quem quiser se divertir caçando referências fique à vontade para compartilhar no espaço de comentários. Eu chamo a atenção, por exemplo, quanto a crueldade de Alan Moore para com o personagem principal de Robinson Crusoé, de Daniel Defoe (1660-1731), cujo destino poderia ter sido muito diferente e prazeroso caso tivesse tido acesso a edições anteriores desse acalentado Almanaque.

Avançando para o norte, nas águas costeiras do Brasil, passamos pela imaculada e erudita ilha pagã de Eugea; a inóspita Nimatan, com seus requintados manicômios; a antiga colônia Romana de Oceana e a república idealista conhecida como Spensonia, fundada por um grupo de mais ingleses vítimas de naufrágio arrastados pelas ondas até esse lugar nos últimos anos do décimo oitavo século. Por fim, somente há poucas milhas marítimas, além de Spensonia, nós alcançamos outra ilha-república bem mais famosa, a aclamada ‘sociedade perfeita’ conhecida como Utopia, batizada pelo seu mais antigo regente, o Rei Utopos. Até sua lamentável decadência durante o final do século XVI e o início do século XVII, Utopia era reconhecida em todas as partes do mundo como o estado ideal que a humanidade poderia socialmente aspirar a ser um dia. Durante o começo do século XVI, Utopia foi governada pelo extraordinário gigante Gargantua, e foi, de fato, o local do nascimento do seu filho, de tamnaho bem similar, Pantagruel. As guerras com reinos vizinhos, no final do ano 1500, desestabilizaram Utopia de tal maneira que nesse período atual de nossa escrita (1931), o outrora perfeito país não passa da ruína lúgubre de uma ilha quase desabitada, com visitantes em potencial sendo desencorajados por um clima opressivo de melancolia que cerca os arrepiantes escombros derrotados de Utopia.

Passando pela Ilha do Macaco-Aranha, onde uma guerra entre duas tribos, em 1839, foi apaziguada por um doutor inglês visitante, a quem os nativos da ilha, desde então, têm se referido como “Rei Jong”, nós avançamos para o oeste, ao redor da Alta América do Sul, para alançarmos os mares das Índias Ocidentais. Aqui, encontramos a Ilha Venchurch com seus selvagens leões-marinhos carnívoros, e Fonseca, rodeada por uma névoa tão impenetrável que, frequentemente, achavam que a ilha se desvanecia magicamente. Aqui também fica a Ilha Oroonoko, onde o povo rubro-amarelo da ilha tratará algumas pessoas como mortas, caso elas não tenham aparecido para o jantar, e a Ilha de Ferdinand, livre de querelas, colonizada por escravos na metade do século XVIII. Contudo, muito mais interessante, são as duas ilhas separadas por, talvez, um quilômetro e meio de água e, no entanto, aparentemente, com cada uma se esquecendo da presença da outra. Uma é a ilha de Speranza, algumas vezes chamada de Ilha do Desespero, onde um tal de Rob Crusoé, até pouco tempo vivendo em York, passou muitos anos de solidão e sofrimento logo após o naufrágio do seu navio na região, durante os últimos dias de setembro de 1659. Ironicamente, a uma curta distância a nado de Speranza, situa-se uma ilha conhecida como Terraela, povoada por uma raça de adoráveis mulheres que geram suas filhas utilizando os métodos de partenogênese – o desenvolvimento do óvulo não fecundado, do qual resulta um indíviduo como os outros – e que, simplesmente, não vislumbram um homem desde o século IV d.C. Se, ao menos, o navegante encalhado tivesse adquirido alguma edição anterior desse Almanaque, seu isolamento poderia ter sido convenientemente aliviado (...)

O Brasil, todavia, é um reservatório para as maravilhas de procedência bem menos duvidosa. No seu litoral situado à sudoeste, logo após passarmos pela desventurada Nolândia, alcançamos Happiland, um território livre de discussões cívicas devido a um antigo monarca, que acabou impondo um limite sobre o montante de ouro que um rei poderia manter, legalmente, junto ao seu tesouro. Embora não seja, de forma alguma, um território opulento, Happiland tem durado mais tempo que a vizinha ilha república de Utopia, outrora sua superiora. Aglaura, ao norte de Happiland e a alguns quilômetros a oeste do Rio de Janeiro, quase parece ser, por qualquer razão, duas cidades ocupando o mesmo espaço. Uma é sem vida e descaracterizada, embora, de vez em quando, das suas ruas desbotadas seja possível ver de relance uma cidade diferente, rica em acepção, sendo que a importância dessa é, pesarosamente, inefável. Mais ao norte, junto à costa, chegamos a Watkinsland, com uma cidade abandonada no seu elevado platô e uma variedade rara de fauna, incluindo o desagradável hominídeo do tamanho de um homem e, geralmente, sobre dois pés, que tem sido citado como um ‘cão-rato’. Lemuel Gulliver, que estava ciente de Watkinsland, acreditava que esses cães-ratos fossem primos dos Yahoos, uma espécie igualmente nociva que ele havia encontrado na, não tão distante, ilha dos Houyhnhnms. Não muito longe de Watkinsland, a noroeste, fica Quivera, uma terra fértil em rubis que, inacreditavelmente, foi colonizada pelos galeses durante o ano de 1170.

No entanto, é o interior do Brasil que representa o centro de algumas das mais notáveis localidades da América do Sul. No profundo interior das florestas da Amazônia, por exemplo, supõe-se existir o remoto reino das selvas conhecido como Mu, bem provavelmente, o mesmo reino descrito pelo ilustre viajante do século XVIII, Cândido, e seu preceptor, o Dr. Pangloss, como a “Terra Fabulosa”. Em outras fontes de informações, Mu também é denominada como ‘Yu’ ou ‘Yu Atlanchi’, e é perto daqui que a mundialmente famosa ‘garota-pássaro’ Riolama, ou Rima, foi encontrada nos últimos anos do século XIX. A estátua de Riolama, feita por Jacob Epstein, encontra-se ao lado da versão , idealizada pelo mesmo artista, de Edward Hyde no antigo Serpentine Park, renomeado como Hyde Park, após os eventos do ano 1898.

O mais extraordinário dos lugares misteriosos do Brasil, que nós guardamos para o final, é a Terra do Bordo Branco, um platô localizado no estado do Amazonas, explorado, em 1912, pelo ocasional companheiro da Liga, George Challenger. Aqui, sobrevive um grande número de espécies que há muito tempo pensava-se estarem extintas, incluindo o tigre-dentes-de-sabre e muitos dinossauros. Uma raça de homens-macacos, compreensivelmente relacionada aos ‘cães-ratos’ ou aos Yahoos, outrora existiu no platô, antes de ser etnicamente expurgada por uma tribo indígena local chamada Accala, e alguns lugares próximos à Terra do Bordo Branco têm apresentado indícios de infestação por espécies que parecem ser pré-históricas na sua origem. A alguns poucos quilômetros descendo pelo rio Amazonas, a partir doplatô vulcânico, por exemplo, há um lago isolado conhecido pelas tribos indígenas da região como a Lagoa Negra, onde monstruosos anfíbios bípedes, aparentemente, têm sido avistados. Esses podem ser alguns, até esse momento, desconhecids atavismos siluriano, que vieram correnteza abaixo, da Terra do Bordo Branco, ou até poderiam ser treinadas vocalmente,encontradas na Ilha de Marsh, a grande distância no Pacífico.

5 comentários:

Octavio Aragão disse...

Não seria legal ver um almanaque desses com as Terras Fantásticas da FCB? A República 3000, do Menotti Del Picchia, a Campinoigrande, de Bráulio Tavares, o Sítio do Picapau Amarelo... tudo no mesmo território?

Romeu Martins disse...

Oh, se ia. Fora as conexões entre personagens, por exemplo, o Homem-macaco de "Amazônia misteriosa", do Gastão Cruls, com as experiências embrionárias de "O sorriso do lagarto", do João Ubaldo Ribeiro.

Se montassem um site sobre isso, seria o Would Newton Universe brazuca!

Octavio Aragão disse...

Hmmm... idéias, idéias,idéias. Mas isso fica para 2011, pois este ano está lotado.

Romeu Martins disse...

Que esta seja a década do vapor, então!

Leonardo Peixoto disse...

Realmente Robinson Crusoé perdeu uma grande oportunidade lol
Mais do que Alan Moore pensa , o Brasil é de fato um reservatório para maravilhas , só nos falta aproveitarmos essa fonte em potencial que , assim como a Liga , é extraordinária !