17.1.12

Feliz aniversário, envelheço na cidade 3

Dia 17 de janeiro já é uma das pequenas tradições desta página fazer um post especial celebrando o aniversário de criação do blog. O de hoje, em comemoração do terceiro ano de atividade do Cidade Phantástica, vou dedicar ao próximo livro que vai trazer um conto meu, um projeto que me senti realmente privilegiado em poder participar. Sherlock Holmes - Aventuras secretas é a primeira coletânea nacional a trazer contos inspirados na criação mais importante de Arthur Conan Doyle, o personagem que fundamentou nosso imaginário da Era Vitoriana e que é um pioneiro nas fórmulas consagradas até hoje na indústria do entretenimento. Editada pela Draco, com capa e projeto gráfico de Erick Sama e organizada por Carlos Orsi Martinho e Marcelo Augusto Galvão, a obra traz contos de Alexandre Mandarino, Cirilo Lemos, Lúcio Manfredi, Octavio Aragão, Rosana Rios e deste blogueiro. O lançamento vai ser no dia 4 de fevereiro, na Livraria Martins Fontes, em São Paulo, mas a coletânea já se encontra em pré-venda e com um belo desconto aos interessados. Reproduzo para marcar esta data, que é bem especial para mim, o trecho inicial do meu conto "O Caso do Desconhecido Íntimo", que já havia aparecido por aqui anteriormente, mas agora surge em uma versão um pouco maior. Boa leitura, obrigado pela companhia nestes três anos de blogagem.






O caso do desconhecido íntimo

Foi com ar melancólico que dispensei o cabriolé alugado, diante do hospital onde iria encontrar um homem que, esta era minha impressão naquele momento, poderia ter sido o amigo mais íntimo que jamais tive. A melancolia não dizia respeito à proximidade das festas natalinas, que se misturava ao frio enregelante do fim de tarde. Não eram as cobranças familiares, nem as movimentações das compras de fim de ano que me ocupavam a mente naquele dia. Também não era a pobreza ao meu redor, no bairro mais mal afamado de Londres. Nada disso. As sombras que me caíam sobre a cabeça nada tinham a ver com preocupações cotidianas da grande maioria das pessoas que eu conhecia.

A angústia que sentia, enquanto me encolhia dentro de meu casacão e caminhava por uma trilha até a portaria do prédio centenário, não dizia respeito ao mundo em que eu vivia, mas sim a outro, que poderia ter havido.

Passei pelo pórtico e quase fui pisoteado pelos médicos e enfermeiras que davam plantão no Hospital de Londres, em uma correria aparentemente desorganizada para atender uma ainda maior multidão de pacientes. Ali, na zona sul de Whitechapel Road, entre as explosões de violência que acometem prostitutas e marinheiros bêbados, o que não faltavam eram pessoas a serem remendadas. Já havia tido minha experiência em hospitais, mas nada que se comparasse àquilo. Por isso mesmo, tratei de ficar o mais longe possível do trajeto dos profissionais e, ao mesmo tempo, erguia a cabeça à procura de um rosto vagamente conhecido.

Preciso fazer justiça: o médico esperado não demorou a aparecer. Ele reconheceu meu sem-jeito de longe e veio em minha direção com o braço erguido, o que me fez pular do canto onde estava para saudá-lo, como faria a alguém que me trouxesse uma corda em caso de afogamento:

– Doutor Stamford, há quanto tempo não nos víamos? Desde meus dias estudando, por conta própria, nos laboratórios do primeiro hospital em que o senhor trabalhava, não?

Ele parou diante de mim antes de me responder à saudação. Por certo, estava examinando minha aparência, determinando o quanto eu havia mudado nos quase sete anos que separavam o momento da última vez em que havíamos nos encontrado. Certamente já não era mais tão magro quanto ele se lembrava de mim, minha barriga havia crescido desde que contraí matrimônio, sei bem disso.

– Muito tempo, meu caro. Pode me chamar de Phil, por favor. Como deve imaginar, passei as últimas semanas relembrando em detalhes a derradeira vez em que nos vimos.

Apertamos as mãos com força. Stamford não havia mudado tanto quanto eu, notei.

– Percebo o porquê, claro. Também não tenho pensado em outra coisa nestes dias, desde que recebi sua correspondência, Phil. Curiosamente, aquela ocasião em que nos vimos já era especial para mim de qualquer maneira, antes mesmo de eu ficar sabendo dos inesperados eventos que nosso encontro rápido provocou em seu paciente.

O doutor pareceu não entender do que eu falava à primeira vista, mas logo a compreensão surgiu em seu olhar.

10 comentários:

Pedro Dobbin disse...

Quando voltar de férias meu exemplar já deve ter chegado. Pela prévia aqui será uma ótima leitura.
Abraços,
Pedro Dobbin

Romeu Martins disse...

opa, se quiser compartilhar a opinião quando tiver lido, Pedro, já sabe: as portas deste edifício estão abertas ;-)

Anônimo disse...

Parabéns, Romeu! E também um grande obrigado por ter um blog de alta qualidade como o Cidade Phantástica :) Um abraço e sucesso!

Romeu Martins disse...

Eu quem agradeço a leitura e o convite para um projeto do qual me orgulho muito mesmo em poder participar, Galvão ;-)

Cirilo S. Lemos disse...

O Comendador Romeu faz um grande trabalho aqui. \o/

Romeu Martins disse...

hehe, brigado, colega elementar. O importante é a gente se divertir no processo ;-)

Octavio Aragão disse...

Parabéns, Romeu! O CP é leitura indispensável.

Romeu Martins disse...

Brigadão, Octavio, ser lido por uma das minhas grandes influências na FCB é um dos prazeres que este blog me dá.

Octavio Aragão disse...

Ah, falando nisso, o conto (sim, virou conto) Rainha das Estrelas, que você teve a fineza de revisar nos seus primórdios) foi terminado agora. Queria te agradecer aqui, ao vivo e a cores, pela boa vontade.

Romeu Martins disse...

Opa, imagina, nada a agradecer. Só lamento eu não ter tido tempo entre o final do ano passado e o começo deste para ler a versão integral, mas as coisas andam bem atribuladas por aqui, em termos de trabalho e vida social.